segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Livros, Discos e Sei Lá Mais o Quê # 07



Livro indicado: O Perfume - história de um assassino


É muito comum ouvir falar por aí que uma imagem vale por mil palavras. Contudo, algum de vocês já parou para se perguntar quantas palavras são necessárias para compor um único cheiro? Pois bem, foi essa a missão quase impossível a que se propôs, com bastante êxito, o escritor alemão Patrick Süskind, no seu primeiro romance O Perfume, publicado pela primeira vez na forma de folhetim pelo jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung e, mais tarde, já como livro, em 1985.



O livro narra a história de Jean-Baptiste Grenouille e revela, assim, a trajetória de um estranho jovem, rejeitado pela mãe, pelas amas-de-leite, pelos colegas do orfanato e demais cidadãos da fétida Paris do século XVIII. Porém, Grenouille guarda um segredo que lhe retira do imenso grupo de homens e mulheres à procura de sua própria identidade e se distingüe dos demais seres humanos por duas características muito peculiares: ao mesmo tempo em que não possui cheiro algum, sua capacidade olfativa transcende qualquer limite imaginado pelo mais engenhoso dos homens. Os caminhos que percorre nosso inusitado protagonista, levam-nos ao epicentro das paixões humanas e, ainda que deste conteúdo sirvam-se variadas obras da literatura universal, é impressionante a capacidade do autor em traduzir, sob a restrita forma das palavras, toda uma rede sensorial baseada no olfato, que leva seu leitor a uma experiência literária singular e salutar. Confiram o trecho abaixo:



"Na época de que falamos, reinava nas cidades um fedor dificilmente concebível por nós, hoje. As ruas fediam a merda, os pátios fediam a mijo, as escadarias fediam a madeira podre e bosta de rato; as cozinhas, a couve estragada e gordura de ovelha; sem ventilação, salas fediam a poeira, mofo; os quartos, a lençóis sebosos, a úmidos colchões de pena, impregnados do odor azedo dos penicos. Das chaminés fedia o enxofre; dos cortumes, as lixívias corrosivas; dos matadouros fedia o sangue coagulado. Os homens fediam a suor e a roupas não lavadas; da boca eles fediam a dentes estragados, dos estômagos fediam a cebola e, nos corpos, quando já não eram mais bem novos, a queijo velho, a leite azedo e a doenças infecciosas. Fediam os rios, fediam as praças, fediam as igrejas, fedia sob as pontes e dentro dos palácios. Fedia o camponês e o padre, o aprendiz e a mulher do mestre, fedia a nobreza toda, até o rei fedia como um animal de rapina, e a rainha como uma cabra velha, tanto no verão como no inverno. Pois à ação desagregadora das bactérias, no século XVIII, não havia ainda sido colocado nenhum limite e, assim, não havia atividade humana, construtiva ou destrutiva, manifestação alguma de vida, a vicejar ou a fenecer, que não fosse acompanhada de fedor".

Um comentário:

Marília Silva Tavares disse...

Eu vi o filme! E já fiquei louca para ler o livro, lendo este trechinho fiquei ainda mais interessada!
Achei que o desafio de transmitir cheiros foi vencido nas telinhas tbm, o filme é belíssimo! Fizemos um vídeo-debate sobre Perfume e saiu cada reflexão interessante...
Bom saber que vc tem bom gosto, agora sei que posso seguir suas sugestões!

Adorei seu blog, viu? Já está linkado na minha lista. Se puder dá uma passadinha pelo meu espaço, ficaria muito feliz!

Abraços!!